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  • Marina

Jardineira de apartamento


Houve uma fase (dentre as várias fases) durante este período de isolamento social, em que passei muitas horas dos meus dias assistindo videos no YouTube sobre vida no campo. Era a única atividade que parecia me trazer algum alento: saciar minha sede por imagens e informações sobre plantar, viver da terra, ter um "homestead" (como se chama em inglês uma pequena propriedade auto-suficiente, onde se produz em micro escala alimentos para consumo próprio). Confinada oito andares acima da selva de pedra chamada São Paulo, por um tempo assistir a outras pessoas falando (e fazendo) aquilo que eu almejava no meu futuro me ajudou a criar certa sanidade mental.


Em um dos videos que assisti, no canal de uma família que trocou a vida em uma cidade nos EUA para ter um homestead no campo, a mãe da família em questão dividia sobre algumas decisões que, se pudesse, teria feito diferente em relação a esta mudança de vida. Dentre elas, contou que, olhando para a época em que ainda estava na cidade e o campo era apenas um projeto, percebeu que acabou focando muito do seu tempo e energia estudando sobre um milhão de técnicas, porém nenhum tempo testando tudo aquilo na prática. Nas palavras dela, ainda que admitisse que o estudo foi importante, ela dizia que, hoje, percebeu que poderia ter colocado a mão na massa logo de cara, do jeito que desse — plantando em vasos, usando quaisquer recursos que tivesse disponíveis naquele momento, fosse uma sacada, uma janela ensolarada, algumas sementes e um vaso — e, assim, aprendido com seus próprios erros e acertos, algo muito mais valioso do que a teoria sozinha. No vídeo, dizia algo como "transforme sua sala de espera em uma sala de aula", ou seja: comece a plantar agora, como você pode. Não espere as condições que imagina como ideais, pois o aprendizado que a experiência permite, dentro de quaisquer circunstâncias que seja, já é um conhecimento muito mais rico do que os livros e blogs podem oferecer.


Este conselho mexeu comigo. Ela tinha toda razão. No passado já havia pensado em cultivar algumas hortaliças na janela, mas nunca coloquei em prática, e já nem sei mais qual desculpa esfarrapada me dava. Diante deste conselho do video, a possibilidade de plantar de novo me deixava empolgada, porém ainda assim relutante. Só que, desta vez, não queria deixar a empolgação mais uma vez se afundar em dúvidas. Então sentei comigo mesma para ter uma conversa séria, e me perguntar com sinceridade: o que eu temia? "Pode dar errado. As plantas podem morrer. Os tomates podem não nascer, e as sementes não germinarem. E eu vou ficar muito chateada por ter falhado." A-há... aí estava ele de novo, o medo. Mas diferente de outras vezes, o medo já não me dava medo (!), e eu tinha as ferramentas para contra-argumentar. "E daí se falhar? Você terá aprendido com os erros que fizer, e isto será muito mais valioso do que ficar apenas desejando ter uma horta em um quintal que sequer existe. Você está aqui, agora. Faça sabendo que há grandes chances de dar errado, e já inclua a falha no processo. Se der errado, terá aprendido... e na próxima, não fará de novo. "


Incluir o que chamamos de 'erro' e 'falha' nos processos não é nenhuma novidade — felizmente este é um assunto que tem sido bastante abordado por todos os cantos. Ainda assim, na famosa hora do "vamos ver", quantas vezes a gente se esquece disso? Parece até metamensagem: a teoria ajuda, mas a prática é o que realmente abre os caminhos.

tomateiros em 28 de junho...


O restante desta história eu quase não preciso contar, pois as fotos que você vê neste post falam por si. Nos dias que seguiram tratei de colocar a horta em prática, e a cada etapa do processo fui descobrindo que já tinha tudo o que precisava aqui mesmo: as sementes dos tomatinhos vieram... de tomatinhos (a gente esquece às vezes que a natureza nos fornece milhares de sementes que chegam até nós 'de brinde' na maioria dos legumes e frutas que comemos). Bandejas de isopor que iriam para o lixo viraram sementeiras. Vasos eu tinha, terra também, mas era um saco de terra vegetal que estava por aqui há uns 2 anos, então imaginei que não haveriam muitos nutrientes mais nela. Na internet aprendi como fazer um adubo caseiro, com borra de café, cascas de banana e de ovo. Pronto, adubo natural.


Repare que nenhum destes elementos era o "ideal". Mas eram os possíveis naquele momento, e não ter o considerado 'ideal' à mão não impediu que meus tomatinhos crescessem, vingassem e dessem frutos. Talvez meus tomateiros não sejam os mais vistosos da galáxia, talvez não recebam todo o sol de que precisam... mas isto pouco importa. Prefiro focar na beleza da generosidade da natureza: dê-lhe um pouco de luz água e terra, alguma energia de cuidado, e ela floresce. Não requer muito. E tudo depende da gente ultrapassar o medo de errar.


Falando errar, os 'erros' vieram, claro. A teoria (e a grande generosidade daqueles que compartilham conhecimento) me ajudaram a ter um certo norte para lidar com eles: saber mais ou menos o que fazer, o que esperar, como cuidar. Aliás, a parte dos cuidados me surpreendeu, pois descobri que os tomateiros demandam muito menos tempo e cuidado do que eu imaginava — todos os dias cuido deles (e os namoro um pouco, confesso!) por uns 5-10 minutos, e apenas eventualmente passo um dia mais ativo trocando vasos, adubando...fazendo uma baguncinha maior. A cada nova dúvida, corro pra "perguntar" aos amigos Google e Youtube o que poderia fazer. E é incrível como sempre existe alguém que já passou pelo mesmo problema, por mais específico que ele pareça ser. Algumas dicas me ajudaram a resolver... outras não funcionaram, e resolvi sozinha.


... floridos em 20 de julho ...


Ainda na questão dos aparentes erros, preciso constantemente manter aquele olhar aberto, para não voltar ao pensamento do "não estou fazendo o ideal". Aprendi a afiar minha intuição, estar presente com o que está na minha frente, e entendi que soluções universais dificilmente são efetivas. É sempre melhor que venham acompanhadas de observação curiosa, pois cada circunstância é única. Isso vale pra vida... mais ainda pra uma pequena horta. Afinal, nenhum outro tomateiro existe nesta janela, nestes vasos, nesta terra... Então tento manter em mente que conhecimento e teoria são fluídos como água; se expandem, se moldam, se adaptam e se renovam com a prática, de acordo com o que está ali na nossa frente. Mas não precisam (e nem devem) ser ponto final. Usar a teorias e dicas de um jeito rígido é acabar não tirando o melhor proveito delas.


Por exemplo, o tal do adubo natural que usei na terra, acabou atraindo moscas-de-fungo, um mosquitinho minúsculo mas bem danado, que gosta de terra rica em matéria orgânica e úmida — descobri que ele é bem comum em estufas, lugares com condições ideias pra ele proliferar, e que, pensando bem, é um ambiente bem parecido com os meus vasos na janela. Só este aparente problema já me trouxe vários aprendizados, me fez testar um monte de soluções caseiras, naturais e por vezes surpreendentes pra lidar com eles, além de me fazer entender que em vasos e dentro de casa, é melhor usar adubos já curtidos e prontos. Troquei então a adubação por um fertilizante natural líquido e a situação desde então está bem mais controlada.


Eu poderia ficar horas aqui contando tudo o que cultivar estes simples tomatinhos tem me ensinado, tanto na parte prática quanto nos ensinamentos mais profundos, de vida mesmo (e voltarei certamente a falar sobre tudo isso!) Mas, por ora, fico por aqui, só com este convite e lembrete pra gente sempre ir além — da teoria, do medo, da crença nas condições ideais. Melhor fazer o que quer que seja com o que quer que a gente tenha em mãos. Inspiração e aprendizado teórico são ótimos, mas é preciso lembrar que são limitados, pois sempre vão nos contar algo em segunda mão, e nunca vão nos dar a satisfação da vivência.


... e frutificando em 4 de agosto.


Aproveitando, vou deixar aqui abaixo uma lista de pessoas — canais do YouTube e contas no Instagram — a quem tenho recorrido continuamente pra simplesmente me inspirar, ou pra me ajudar com dúvidas. Vai que te anima a plantar algo também.

 

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